Algumas perguntas a Teolinda Gersão
sobre o conto «A Velha»
1- A velha morreu a dormir, num sonho
“bonito” que introduz o leitor de forma suave nessa morte, duvidando dela
inicialmente. Porquê essa suavidade, porquê deixar o leitor na dúvida acerca
dessa morte final?
R:
Penso que o leitor só no primeiro momento duvidará, depois percebe que nunca
mais regressar de um sonho significa que não voltou a acordar, portanto está
morta. O final “feliz” é um modo de falar da velha com o carinho que ela
merece, e nem sempre teve na vida.
2- A velha protagonista deste conto é
ironicamente feliz parece querer dizer-nos logo no início do conto. Mas também
podemos ler a história e perceber que por saber dar o verdadeiro valor às
“coisas” esta velha era realmente feliz. Parece-lhe possível fazer estas duas
leituras? Quando escreveu o conto procurou esta ambiguidade?
R:
Sim, a ambiguidade foi intencional. É por ironia que se diz que ela era
felicíssima, quando na realidade lhe faltava quase tudo.
Mas
também é verdade que, apesar disso, ela sabia ser optimista, ver a vida pelo
lado melhor, e tirar o melhor partido do pouco que tinha. E no fundo ser
feliz poderá ser isso.
3- Partindo da ideia de que optou pela
ironia para contar toda esta história, o que pretende com “A velha”?
Ridicularizar os velhos através da velha? Provocar o leitor e sensibilizá-lo
para o isolamento social a que estão “condenados” alguns velhos?
R:
A 2ª hipótese, mostrar o isolamento e a fragilidade dos velhos. Ela é muito
forte, e luta, mas nem sempre acontece assim.
Ridicularizar
os velhos nunca. Não há nada de ridículo na velhice, nem em qualquer outra
época da vida. E um velho não vale menos do que qualquer outro ser humano.
4-
É
fácil escrever sobre velhos? Escreve para velhos sobre velhos? Com que objetivo
escreve sobre esta faixa etária?
R: Em A Mulher que Prendeu a Chuva escrevi também sobre um velho, no conto «As Tardes de
Um Viúvo Aposentado».
Não
escrevo para velhos nem novos, nem especificamente para nenhum público-alvo.
Escrevo para quem quiser ler, qualquer que seja a idade.
Não
é mais fácil nem mais difícil escrever sobre qualquer assunto, é sempre uma
escolha. A mim tudo me interessa, na vida e no mundo, e as personagens podem
vir de qualquer lugar.
5- Inspirou-se nalguma velha ou
nalguma situação real para escrever esta história ou o conto é fruto da sua
imaginação?
R: Pensei
– com muito carinho - na minha avó e na
minha mãe, para quem a vida nunca foi fácil, mas foram mulheres muito fortes e
positivas, que me deram grandes lições de vida. Mas a personagem deste conto
vive em condições muito diferentes, e é uma figura inventada.
(Entrevista feita por email
e publicada a 26 de maio de 2018
com a autorização da escritora)
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